A Ressurreição de Jesus Cristo: fonte e fundamento da nossa Esperança

Todos os anos, os cristãos são chamados a escalar “a montanha mais alta da nossa fé”, que é a Páscoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, a comemoração de Sua Paixão, Morte e Ressurreição. De fato, não há realidade mais importante para a nossa fé, a qual está fundada nesse evento pascal. Como diz Paulo: “Se Cristo não ressuscitou, ilusória é a vossa fé” (1Cor 15, 17). Esse evento pascal, em si, é fundamentado na Aliança de Deus com o Seu povo, uma aliança iniciada com Adão, depois renovada com Noé, para ser concluída como a “Primeira Aliança” com Abraão, Isaac e Jacó, e agora definitivamente cumprida em Jesus Cristo. É essa Nova Aliança que dá aos fiéis a vida de Deus, que é a vida eterna. Cristo crucificado e ressuscitado é a nossa esperança! Não pode haver definição melhor do que a dada pelo grande exegeta Padre Marie-Joseph Lagrange 1, que, falando dessa Nova Aliança, a descreve como “o abraço de Deus”, para expressar a união do Filho de Deus com a humanidade no mistério da Encarnação e da Cruz. Nesse “abraço” com a humanidade, Cristo se une a cada ser humano, cumprindo o mistério da Redenção por meio da Encarnação e da Cruz.

Esse mistério, iniciado no ventre da Virgem Maria, é cumprido na cruz e na morte de Jesus. O Filho de Deus, que tomou sobre si o mal e todos os infortúnios e misérias da humanidade de todos os tempos, derrama a glória de Sua divindade sobre aqueles que colocam a sua fé e a sua confiança Nele. A humanidade de Jesus foi semelhante à de todos os homens, exceto no pecado, e ela é o denominador comum de Deus com o gênero humano: “Pela Sua encarnação, Ele, o Filho de Deus, uniu-se de certo modo a cada homem” 2.

A esperança não é algo, mas Alguém!

Para os discípulos, o que ficou gravado como um trauma no espírito deles foi certamente o evento da Cruz. Para eles, companheiros na comunidade por três anos de vida intensa, tudo desmoronou, tudo acabou. Mas, especialmente para os discípulos da cultura judaica, essa Cruz foi considerada “a Cruz infame”, símbolo da morte e, acima de tudo, da maldição (cf. Dt 21, 22-23; Gl 3, 13), o pior insulto e humilhação que poderia ser feito a um homem condenado, quanto mais ao Messias. “‘Selaram a pedra’ (Mt 27, 66). Tudo parece ter acabado. Para os discípulos de Jesus, aquela pedra marca o fim da esperança. O Mestre foi crucificado, morto da maneira mais cruel e humilhante, pendurado num patíbulo infame fora da cidade: um fracasso público, o pior final possível – naquela época era o pior. Pois bem, aquele desânimo que oprimia os discípulos não nos é totalmente estranho hoje.” 3

Foi somente mais tarde que os discípulos de Jesus descobriram um novo começo, na própria Cruz. Como o Papa Francisco explica em suas catequeses: “Pensemos precisamente na cruz: do mais terrível instrumento de tortura, Deus obteve o maior sinal do amor. Aquele madeiro de morte, transformado em árvore de vida, lembra-nos que os inícios de Deus começam muitas vezes a partir dos nossos fins: é assim que Ele gosta de fazer maravilhas. Então, hoje olhemos para a árvore da cruz, para que em nós brote a esperança: aquela virtude diária, aquela virtude silenciosa, humilde, mas aquela virtude que nos mantém em pé, que nos ajuda a ir em frente. (…) Hoje, olhemos para a árvore da cruz para que germine em nós a esperança: para sermos curados da tristeza – mas, quanta gente triste…” 4

Não foram os pregos que prenderam Nosso Senhor à Cruz, foi o amor

Com os olhos da fé, a morte de Jesus na Cruz representa o ápice do amor de Deus, que é mais forte do que a morte. “Nem os pregos nem a cruz poderiam ter detido o Verbo, o Filho de Deus, se o amor não o tivesse prendido”. Como Santa Catarina de Sena expressou em várias de suas cartas: “O sangue de Cristo tornou-se fonte para lavar nossas enfermidades, e os cravos tornaram-se a chave para abrir a porta do céu.” 5 “Os cravos sozinhos não seriam suficientes para retê-lo, se não houvesse o amor. São esses laços que amarram a alma em Deus e a tornam uma só coisa com Ele, numa união de amor. Ó doce e terno amor! Tu purificas a alma, dissolves a nuvem da paixão sensível, iluminas a inteligência e fazes contemplar a eterna verdade.” 6

O Beato Raimundo de Cápua, que foi o pai espiritual de Santa Catarina, sublinha este ponto no livro da sua Vida: “Não foram os pregos que prenderam Nosso Senhor à cruz, foi o amor; não foram os homens que venceram, foi o amor; como poderiam os homens ter vencido Aquele que, com uma palavra, os teria derrubado a todos por terra?” 7

Todos os anos, a Igreja celebra a Páscoa desse “abraço de Deus” com a humanidade através do Corpo de Jesus: Doloroso em Sua Paixão, Luminoso em Sua Ressurreição e Fortalecido pelo Espírito Santo no Amor do Pai. O Papa São João Paulo II, que sofreu durante muitos anos antes de sua morte, obteve da Cruz de Cristo “a esperança que brota da Cruz” 8.

Todos nós conhecemos a famosa declaração do Apóstolo São Paulo: “Se Cristo não ressuscitou, ilusória é a vossa fé” (1Cor 15, 17). O mesmo poderia ser dito sobre a esperança: “Se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa esperança”. Mais adiante, São Paulo continua dizendo: “Se esperamos em Cristo somente para esta vida, somos os mais miseráveis de todos.” (1Cor 15, 19) “A esperança nasce do amor e se funda no amor que brota do Coração transpassado de Jesus na Cruz.” 9

Jesus Cristo ressuscitado é a fonte da minha Esperança?

O ano de 2033 será o próximo Ano Jubilar, que celebrará o aniversário jubilar da Morte e Ressurreição do Senhor. Do Coração aberto de Jesus na Cruz ainda corre hoje como “um rio de água viva” (Jo 7, 37-38), que regenera, transforma e ressuscita tudo aquilo que toca e rega.

“Tal esperança encontra o seu centro propulsor na Ressurreição de Cristo, que ‘contém uma força de vida que penetrou o mundo. Onde parecia que tudo morreu, voltam a aparecer por todo o lado os rebentos da ressurreição. É uma força sem igual. É verdade que muitas vezes parece que Deus não existe: vemos injustiças, maldades, indiferenças e crueldades que não cedem. Mas também é certo que, no meio da obscuridade, sempre começa a desabrochar algo de novo que, mais cedo ou mais tarde, produz fruto’.” 10

Esse também foi o desejo e a oração do Apóstolo São Paulo pelos cristãos de Éfeso, a quem ele dirigiu sua cartas. As suas palavras, imbuídas de fé, também são para nós:

“Que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos dê um espírito de sabedoria e de revelação, para poderdes realmente conhecê-Lo. Que Ele ilumine os olhos dos vossos corações, para saberdes qual é a esperança que o seu chamado encerra, qual é a riqueza da glória da sua herança entre os santos e qual é a extraordinária grandeza do Seu poder para nós, os que cremos, conforme a ação do Seu poder eficaz.” (Ef 1, 17-19)

A esperança, que parecia morrer, renasce

O Papa Francisco, como Pastor do grande rebanho da Igreja de hoje, nunca deixa de instruir, de maneira realista, a nossa fé e a nossa esperança. Em suas catequeses, particularmente no dia 5 de abril de 2024, destaca dois aspectos importantes do Evangelho que nos ensinam sobre a humilhação de Cristo como um caminho para a redenção, um caminho que realmente alcança todos e cada um de nós:

a) Vemos Jesus despojado: “‘Depois de o terem crucificado, dividiram as Suas vestes entre si, lançando a sorte’ (Mt 27, 35). Deus despojado: Aquele que tem tudo deixa-se privar de tudo. Mas aquela humilhação é o caminho para a redenção. É assim que Deus vence as nossas aparências. Com efeito, nós temos dificuldade em despojar-nos, em fazer a verdade: procuramos cobrir sempre as verdades porque não nos agradam; revestimo-nos de exterioridade, que procuramos e cuidamos, de máscaras para nos disfarçarmos e nos mostrarmos melhores do que somos. É um pouco o hábito da maquiagem: maquiagem interior, parecer melhor do que os outros. Pensamos que o importante é ostentar, parecer, de tal modo que os outros falem bem de nós. E adornamo-nos de aparências, de coisas supérfluas; mas assim não encontramos a paz. (…) Jesus despojado de tudo lembra-nos que a esperança renasce fazendo a verdade sobre nós – dizer a verdade a si mesmo – abandonando as ambiguidades, libertando-nos da convivência pacífica com as nossas falsidades. Às vezes, habituamo-nos de tal modo a dizer-nos falsidades que convivemos com as falsidades como se fossem verdades e acabamos envenenados pelas nossas falsidades. Isto é necessário: regressar ao coração, ao essencial, a uma vida simples, despojada de tantas coisas inúteis, que são sucedâneos de esperança. Hoje, quando tudo é complexo e corremos o risco de perder o fio da meada, temos necessidade de simplicidade, de redescobrir o valor da sobriedade, o valor da renúncia, de limpar o que polui o coração e deixa triste.” 

b) Demos uma segunda vista de olhos ao Crucifixo e vejamos Jesus ferido: “A cruz mostra os pregos que lhe furam as mãos e os pés, o lado aberto. Mas
às feridas do corpo acrescentam-se as da alma: mas quanta angústia! Jesus está sozinho: traído, entregue e renegado pelos seus (cf. Mt 27, 46). Na cruz aparece também o motivo da condenação: Este é Jesus, o rei dos judeus’ (Mt 27, 37). É um escárnio: Ele, que fugira quando procuraram fazê-Lo rei (cf. Jo 6, 15), é condenado por se ter feito rei; embora não tenha cometido crime algum, é colocado entre dois malfeitores e a Ele preferem o violento Barrabás (cf. Mt 27, 15-21). Em síntese, Jesus está ferido no corpo e na alma. Pergunto-me: de que modo isto ajuda a nossa esperança? Também nós estamos feridos: quem não o está na vida? E muitas vezes com feridas escondidas que ocultamos pela vergonha. Quem não carrega as cicatrizes de escolhas passadas, de incompreensões, de dores que permanecem dentro e são difíceis de superar? Mas também de injustiças sofridas, de palavras cortantes, de juízos inclementes? Deus não esconde aos nossos olhos as feridas que lhe trespassaram o corpo e a alma. Mostra-as para nos indicar que na Páscoa se pode abrir uma nova passagem: fazer das próprias feridas furos de luz. (…) Jesus na cruz não recrimina, ama. Ama e perdoa quantos o ferem (cf. Lc 23, 34). Assim converte o mal em bem, assim converte e transforma a dor em amor.”

c) A verdadeira questão é: o que eu faço com as minhas feridas? “Irmãos e irmãs, a questão não é ser ferido pouco ou muito pela vida, o ponto é o que fazer das minhas feridas. As pequeninas, as grandes, aquelas que deixarão um sinal no meu corpo, na minha alma sempre. O que faço com as minhas feridas? E pergunto-te: o que fazes com as tuas feridas, aquelas que só tu sabes? Podes deixá-las infetar no rancor, na tristeza, ou posso uni-las às de Jesus, a fim de que também as minhas chagas se tornem luminosas.” 11

Cuidado com aqueles que transformam as trevas em luz e a luz em trevas

Graças ao progresso no campo das coisas criadas e da tecnologia, muitas vezes chegamos a acreditar que o mundo poderia funcionar sem Deus. Essa atitude de individualismo, autossuficiência e, muitas vezes, de recusa pode levar a uma certa resignação e desumanização desoladoras. Os homens e as mulheres de hoje, assim como muitos jovens, na tentativa de se mostrarem modernos e em sintonia com os tempos, ostentam seus “direitos a novas liberdades”, com títulos enganosos, como: “o direito de dispor livremente do próprio corpo”, “o direito à interrupção voluntária da gravidez”, “o direito de morrer com dignidade”… Se olharmos mais de perto, essas são escolhas sociais com graves consequências e abrem portas para pensamentos e tentações de morte.

a) O “direito de dispor livremente do próprio corpo” O “direito de dispor livremente do próprio corpo” pode levar à banalização e à mercantilização do corpo humano, o que pode incluir o uso de drogas e a aceitação do suicídio como meio de salvação. Entretanto, o corpo humano “não pertence à pessoa”, o corpo “é” a pessoa; ele é inseparável da pessoa. Sem negar certas situações em que a vida se mostra muito difícil de ser vivida e em que a morte pode parecer mais humana e ter mais significado do que a própria vida. No século IV, Santo Agostinho descreveu o suicídio como “homicídio contra si mesmo” 12. O ser humano usa a vida como um bem que não lhe pertence, mas que lhe foi confiado, como um bem que deve dar frutos (cf. Mt 25, 14-30). Quem sou eu para decidir o fim de meu corpo, de meus dias, de minha vida? Isso não faria de mim o “mestre de minha vida” em vez de Deus, o único Mestre da Vida? Com base na Redenção alcançada na Páscoa de Cristo, Paulo escreve: “se vivemos é para o Senhor que vivemos, e se morremos é para o Senhor que morremos” (Rm 14, 8). Então, quem se retira voluntariamente da vida não a está roubando Daquele que lhe confiou uma missão nesta terra?

b) “O direito à interrupção voluntária da gravidez” Na França, o direito ao aborto (Interrupção Voluntária da Gravidez) foi reconhecido em janeiro de 1975, quando uma lei descriminalizou o ato de abortar. Em 30 de janeiro de 2024, o parlamento francês votou por maioria a favor da inclusão na Constituição da “liberdade garantida” para que as mulheres interrompam voluntariamente a gravidez (IVG). Na sequência dessa decisão parlamentar francesa, o serviço de comunicações do Vaticano denunciou claramente uma “Constituição contrária à vida”, em uma mensagem publicada por um de seus responsáveis: “Como é possível associar na Carta fundamental de um Estado o direito que protege a pessoa àquele que sanciona sua morte? Vivemos em uma sociedade tecnologicamente avançada, informatizada, conectada. O desenvolvimento do ser humano desde a concepção não tem mais segredos há décadas. (…) Uma sociedade não é medida por seus tabus, mas por sua capacidade de amar e a liberdade cresce com o amor” 13. A mensagem também reiterou que “o aborto (voluntário) é homicídio”, como Francisco afirmou claramente em sua coletiva de imprensa no voo de retorno da Eslováquia em setembro de 2021 14. c) O “direito de decidir o dia da própria morte” Em vez de ser uma verdadeira liberdade da dignidade humana, essa orientação não acrescenta, ao contrário, uma falta de respeito pela dignidade humana, ou até mesmo uma nova ferida na própria dignidade de cada pessoa humana? Compartilhamos aqui o testemunho resumido de uma pessoa envolvida na assistência paliativa, publicado em um jornal católico francês, em um momento em que os deputados do Parlamento estão trabalhando em questões relacionadas ao “fim da vida”:

“Esse projeto de lei reintroduz em nossa estrutura legislativa o poder de dar a morte. Isso é ainda mais inaceitável porque se aplicará a pessoas que estão em um estado de fraqueza, tristeza e profundo desespero. Essas pessoas não precisam de ser acompanhadas, acima de tudo, para se sentirem amadas e admiradas? Para algumas pessoas que pedem para morrer, será que esse pedido realmente reflete o que elas estão esperando lá no fundo? Recebi muitos depoimentos de candidatos ao suicídio assistido que me explicaram que estavam relutantes no momento da realização do ato. Mesmo que a pessoa peça por isso, como você pode justificar o fato de tirar a vida dela? No meu ponto de vista, não há nenhum pretexto credível que justifique ‘dar a morte’. O próprio princípio desse ato é
inaceitável! Por que ‘dar a morte’ é inaceitável? Ela poderia aliviar o sofrimento? – perguntou o jornalista: ‘Dar a morte’ é inaceitável, porque a vida é um dom.
Recebemos o dom da vida, que é um tesouro.” 15

É importante lembrar, a título de informação, que a questão do lugar da eutanásia e do suicídio assistido provoca um sério debate em muitos países. A maioria dos países proíbe a eutanásia e o suicídio assistido, mas há exceções em cinco países que declararam a eutanásia como legal e ativa: Colômbia, Holanda, Bélgica, Luxemburgo e, desde junho de 2021, Espanha. O suicídio assistido é legal em cinco estados americanos 16. Sobre essas questões, devemos ler o último documento romano: “Dignitas Infinita”, que relembra os fundamentos cristãos essenciais da dignidade humana.

“Mesmo se, por causa dos vários limites ou condições, não é capaz de atuar tais capacidades, a pessoa subsiste sempre como ‘substância individual’, com toda a sua dignidade. Isto se verifica, por exemplo, em uma criança ainda não nascida, em uma pessoa em estado de inconsciência, em um idoso em agonia.” 17

O Papa Francisco se entristece ao constatar que os jovens não têm esperança: “A ilusão das drogas, o risco da transgressão e a busca do efêmero criam nos jovens, mais do que nos outros, confusão e escondem-lhes a beleza e o sentido da vida, fazendo-os escorregar para abismos escuros e impelindo-os a gestos autodestrutivos.” 18

O escritor e filósofo francês Fabrice Hadjadj, que veio de uma família judia e se converteu ao catolicismo, escreve de maneira belíssima, na medida do possível, sobre o desafio dramático do “direito a uma boa morte”: “Como se diz ‘boa morte’ em grego? Chama-se ‘eutanásia’ (‘euthanasia’, de ‘eu’ que significa ‘bom’ e ‘tanatos’ que significa ‘morte’). Essa palavra soou em meus ouvidos com um novo eco. Eu achava que era uma palavra odiosa, por causa da ideia perversa à qual nossa era menos helenizada e ainda menos cristã a havia associado. A etimologia a devolveu a mim em toda a sua vitalidade original (…) Usar eufemismos inteligentes para fazer passar veneno por remédio e promover o assassinato por piedade é o jogo habitual do mal. O profeta Isaías denuncia esse truque: ‘Ai daqueles que chamam o mal de bem e o bem de mal, que transformam as trevas em luz e a luz em trevas, que transformam a amargura em doçura e a doçura em amargura’ (Is 5, 20) (…).

Sua bondade é injetada em doses letais. Com um sentimentalismo ansioso, eles são vítimas de uma ficção gramatical. Eles dizem: ‘Vamos acabar com o sofrimento dele’, como se não fosse uma questão de acabar com o próprio paciente. Continuam: ‘Ele nos pediu repouso’, como se ele não tivesse gritado primeiro em desespero. Percebemos que os pacientes que pedem para morrer estão de fato emitindo um alerta: uma presença amorosa que respire o sopro revigorante da verdadeira esperança ao lado deles, pode levá-los a rejeitar o suicídio, em outras palavras, a esperar melhor pela morte. Mas, em vez disso, acreditamos em suas palavras. Enquanto eles estão sobrecarregados pela dor, falamos sobre o seu pedido livre e lúcido, sua vontade expressa, sua escolha final. E fingimos estar cumprindo o nosso dever, felizes por aliviar um homem e, acima de tudo, por liberar um leito. Se nosso pedido fosse atendido assim que sentíssemos o desejo de morrer, a Terra estaria repleta de cadáveres. Felizmente, Deus não é tão diligente. Ele sabe muito bem que, para nos fazer felizes, é melhor não atender aos nossos desejos (…). Em vez de considerar o moribundo como nosso mestre, aquele que está no cadinho da verdade no sofrimento, em vez de descobrir a sua tragédia e implorar por sua estatura heroica apesar de si mesmo, usamos um tom melodramático com ele e tentamos consolá-lo de forma patética e trivial, como se nele mesmo, não pudesse trabalhar mais do que em nós, o Consolador (…) somos nós que deveríamos estar no lugar certo, não ele; somos nós que deveríamos consolá lo, não Deus. Embora nossa melhor tarefa seja torná-lo consciente do mistério da Vida divina que ele é para nós, nós o deixamos entender que possuímos a verdadeira vida, com nossas bochechas rosadas, e gostaríamos de comunicá-la a ele.” 19

Mil anos são, aos olhos do Senhor, como o dia de ontem que passou

Não nos esqueçamos de que somente Deus conhece “o número dos nossos dias”, como diz o salmista: “Ensina-nos a contar nossos dias, para que venhamos a ter um coração sábio!” (Sl 90, 12)

E se esse número fosse necessário à Sabedoria e à Providência Divinas, para que cada pessoa pudesse cumprir sua vocação à santidade? Na Páscoa, uma nova porta, uma passagem para a verdadeira vida, pode se abrir: nossas feridas podem se tornar portas de luz e fontes de esperança para muitas pessoas que ainda estão sofrendo com as mesmas feridas da vida que nós.

Que possamos consolar os que estão em qualquer tribulação, mediante a consolação que nós mesmos recebemos de Deus.” (2Cor 1, 4)

Neste ano comemorativo dos 1700 anos do Concílio Ecumênico de Niceia, a Igreja faz memória com gratidão da unidade de fé que esse Concílio preservou, em uma época em que a divindade de Jesus Cristo e sua igualdade com o Pai estavam ameaçadas. “Creio em Jesus Cristo (…) gerado, não criado, consubstancial ao Pai; e por meio dele todas as coisas foram feitas” 20.

 

FONTE:

1 Cf. Pe. Marie-Joseph Lagrange, L’Evangile de Jésus Christ (O Evangelho de Jesus Cristo), 1932.

2 Concilio Vaticano II, Gaudium et Spes, n. 22.

3 Papa Francisco, Audiência Geral, 5 de abril de 2023.

4 Ibidem.

5 Cf. Santa Catarina de Sena, Cartas completas, n. 49.

6 Cf. Ibidem, n. 228.

7 Cf. Raimundo de Cápua, Vida de Santa Catarina de Sena, cap. VI.

8 São João Paulo II, Exortação Apostólica Pastores Gregis, 16 de Outubro de 2003, n. 5.

9 Papa Francisco, Bula de Proclamação do Jubileu Ordinário do ano 2025, Spes non confundit, 9 de maio de 2024, n. 3.

10 Papa Francisco, Mensagem para o 61º Dia Mundial de Oração pelas Vocações, 21 de abril de 2024.

11 Papa Francisco, Audiência Geral, 5 de abril de 2023.

12 Santo Agostinho, Cidade de Deus, 1, 17-28.

13 Massimiliano Menichetti, França rumo a uma constituição contra a vida, Vatican News, quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024.

14 Cf. Papa Francisco, Resposta aos jornalistas no regresso da visita a Eslováquia, 15 de setembro de 2021.

15 Cf. Papa Francisco, Entrevista ao Journal La Croix, 23 de maio de 2024.

16 Segundo o artigo Législation sur l’euthanasie et le suicide assisté par pays (Legislação sobre a eutanásia e o suicídio assistido em cada país), disponível em Wikipedia.

17 Dicastério para a Doutrina da Fé, Dignitas Infinita, 5 de março de 2024, n. 8.

18 Papa Francisco, Bula de Proclamação do Jubileu Ordinário do ano 2025, Spes non confundit, 9 de maio de 2024, n. 12.

19 Cf. Fabrice Hadjadj, Le fruit de l’avant dernier mystère – “Eloge” de l’euthanasie (O fruto do penúltimo mistério – “Elogio” da eutanásia).

20 Credo Niceno Constantinopolitano.

 

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